segunda-feira, 20 de junho de 2011

Curtas: Tempos modernos informatizados


Hoje fui ao Poupa Tempo renovar minha habilitação. Fiz todo o processo em uma hora e saí de lá esvaziada. O Poupa Tempo se aproximou muito do filme "Tempos Modernos" do Charlie Chaplin. O personagem fica apertando os parafusos em um movimento contínuo, sem mais perceber o que estava fazendo, não parava. Essa sistemática ritmada e sequencial foi desenvolvida por teorias da administração para que a produção fosse com o menor número de movimentos e com a melhor otimização do tempo. A teoria chamava-se (não sei se é assim ainda) tempos e movimentos. Bem, o Poupa Tempo implantou algo parecido para os procedimentos dos documentos. Em cada guichê para o qual se é encaminhado o atendente tem uma única tarefa a cumprir. Primeiro a checagem da documentação, depois o guichê que emite a guia, na sequência tirar a foto e digitais, pagar no banco, pegar a senha do exame médico, fazer o exame e voltar no guichê para pegar o protocolo. Os atendentes simplesmente executam, nada além disso. O guichê no qual eu mais demorei foi o da foto e das digitais. Como foram dos 10 dedos é demorado mesmo. Tive, então, oportunidade de observar a atendente. Sua fisionomia era de tédio, ela olhava para o computador, esperando carregar a digital para falar: "agora o outro dedo" e isso se repetiu por 10 vezes. Multipliquemos isso por, sei lá, uma média de 50 pessoas por dia (acho que é muito mais) e ela fala isso 500 vezes por dia e por semana 2.500 vezes. Na semana seguinte a contagem se repete: "agora o outro dedo" ou variações do tipo "novamente". Fiquei imaginando se um filho ou o marido, a mãe ou sei lá quem pergunta como foi o dia, o que aconteceu no trabalho, o que será que ela responde? Será que ela consegue sentir algo em relação a sua rotina? Não temos mais aqueles operários como no filme, mas a era da informática e das normatizações ajudam a manter a mesma mecanização. O que mudou? Agora estamos no século XXI. Indivíduos com pouco ou nenhum espaço para criar, para ter algo de si na tarefa, execuções totalmente mecanizadas. Inclusive, esse Poupa Tempo é enorme, cheio de gente. Tive uma sensação de estar em um curral bem grande, com aparente liberdade para pastar, mas . . .  cada coisa em seu lugar. Lá dentro estávamos todos mortos como indivíduos. A diferença entre mim e os atendentes é que saí de lá e fui fazer outras coisas que me trouxeram vida. . . . . eles tem que viver essa morte todos os dias. Cruel.

6 comentários:

  1. Oi, Patrícia!

    Sempre que eu preciso ir a uma repartição pública, eu observo a mesma coisa que você e me pergunto o que deve passar na cabeça desse pessoal que simplesmente executam determinadas tarefas repetidamente... o tédio é, de fato, o maior rival deles!

    Abraços!
    Mairan Teodoro

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  2. Oi Mairan,

    Realmente um tédio.

    Abraços,
    Patrícia

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  3. Perfeitas observações!

    O mundo hoje está completamente no esquema "linha de produção".
    Mas fica difícil pensamos em como melhorar isso, se até mesmo a educação dada atualmente prioriza exatamente isso, virar a manivela sem questionar o porquê das ações.

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  4. Olá Anomimo,

    Virar manivela sem perguntar porquê.... por isso valorizo refletirmos sobre nosso dia a dia. Para não cairmos nessa "armadilha".

    Abraços,
    Patrícia

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  5. Terrível mesmo! Eles poderiam revezar os cargos!

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  6. Olá Lorena,

    Um tédio. Mudar os cargos é uma boa, mas e essa mecanização, como mudar?

    Abraços,
    Patrícia

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